“Tem alguma
coisa errada aqui, eu não sei exatamente o que é, mas tem”. Talvez essa frase, repetida por Cheyenne ao longo do filme, seja o que faz amarração entre o
espectador confortavelmente sentado em sua poltrona numa tarde de domingo e a
estranheza que perpassa “This must be the Place”. A frase, e a interpretação de
Sean Penn – claro! Que apesar de atingir o cômico em diversos pontos do filme,
deixa um quê de amargo na boca desde as primeiras cenas.
A história
trata de um roqueiro velho e decadente, com traços de Ozzy Osborne, entediado
numa vida sem projetos. Mesmo assim, todo dia ele veste o personagem: unhas
pintadas de preto, batom vermelho e uma cabeleira negra que insiste em lhe cair
sobre os olhos. Patético.
Até que um
dia Cheyenne fica sabendo que seu pai (com quem não fala há trinta anos) está
muito doente e precisa ir visitá-lo. De família judaica, o cantor fica ainda
mais bizarro em meio a judeus ortodoxos com suas longas peiot . Logo ficamos sabendo que ele demorou demais (devido à fobia
de avião, ele se deslocou de navio) e, numa das cenas mais emocionantes do
filme, Cheyenne encontra o pai jazendo sobre seu leito de morte. A estranheza
do momento é total: a decoração tipicamente judaica, a boca vermelha e cheia de
rugas do cantor, a comoção da morte e o corpo estendido na cama...Debaixo do
lençol, que ele vacilantemente levanta, somo guiados pela câmera até um número
gravado na pele do pai morto. Sobrevivente de um campo de concentração, o velho
homem dedicara toda sua vida a perseguir um soldado nazista, seu torturador. No
entanto, como a morte chegou antes que ele concluísse sua caçada, esta foi
repassada à Cheyenne como um legado incontornável.
E assim, o
roqueiro infantilizado torna-se um caçador de nazistas! Mesclando emoção e muito
humor, acompanhamos toda a falta de jeito e a sensibilidade de Cheyenne em sua
jornada rumo à realização do último desejo do pai.
“Tem alguma
coisa errada aqui, eu não sei exatamente o que é, mas tem”. O filme nos captura na sensação de
estranheza que essa sentença carreia (ainda mais contrastante quando se pensa na canção do Talking Heads que
dá título ao filme). Meu palpite é que isso se deve ao
fato de que essa frase, pontualmente repetida ao longo do filme, marcando suas
escansões, diz de um sentimento que é velho conhecido de todos nós. Angústia, é
como o vernáculo designa essa sensação de que algo não vai bem, de algo que não
está em seu lugar, embora não saibamos dar-lhe nome. E aí, embora o filme trate
de uma figura a mais oddest possível, estamos ali todos nós.
Seguimos
Cheynne no que ja se converteu num Road Movie, e vemos como a confusão e letargia
do cantor vai se transformando em desejo: Um pai morto, uma causa, e uma
travessia...
Só crianças
não tem vontade de fumar, diz uma personagem a certa altura do filme. Cheyenne
não fuma. Até cheirou heroína...cheirou, porque tem medo de agulha. Só posso
dizer que no final ele acende um cigarro, o resto você precisa assistir para
ver a cara impagável do Sean Penn!
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